Via UOL, em 6 de junho de 2025
Levantamento divulgado nesta sexta (06) mostra que o crescimento da rejeição ao presidente Lula (PT) e ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) beneficia políticos com tom mais moderado e pragmático.
O que aconteceu
A direita avança mesmo sem Bolsonaro.
Um levantamento feito pelo cientista político e Rudá Ricci, presidente do Instituto Cultiva, em nove regiões metropolitanas identificou o crescimento de partidos de direita que se descolaram de Bolsonaro.
Estudo abrangeu áreas metropolitanas do Sudeste e Nordeste.
O professor levantou quais partidos governam as prefeituras das regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Salvador, Recife, Natal, Fortaleza e São Luiz. Ricci identificou um “cinturão de direita” dominando prefeituras no entorno das capitais. Os partidos que mais se destacam são:
- PL (partido de Bolsonaro), em 4 regiões metropolitanas pesquisadas: São Luiz, Natal, Rio de Janeiro e São Paulo;
- PSD (centro-direita) em 5 regiões: Natal, Recife, Salvador, Belo Horizonte e São Paulo;
- PSB (centro-esquerda) em 2: Recife e Fortaleza.
Pesquisadora chama o fenômeno de “bolsonarismo de baixa intensidade”.
Isabela Kalil, do Observatório da Extrema Direita, cita representantes como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) como duas personalidades que se manifestam de maneira mais “suave” que Jair Bolsonaro, sem discursos que violem os direitos humanos. “Com uma aparência ‘soft’, mas que ainda assim permite a implementação de agendas que se desdobrem em violações de garantias fundamentais”, segundo ela.
Bolsonarismo de baixa intensidade ameaça avançar sobre eleitorado lulista no Nordeste.
O fenômeno se desdobra até em áreas metropolitanas dominadas pela esquerda, como Natal (RN) e São Luís (MA), sinalizando que o voto local não obedece à lógica nacional.
A maioria dos brasileiros acredita que nem Lula nem Bolsonaro deveriam se candidatar em 2026.
Para Ricci, os números da pesquisa Quaest divulgada nesta semana revelam um vácuo político alimentado por frustrações cotidianas e uma direita em reconfiguração — fenômeno que o cientista analisa como sintoma de um “pragmatismo hiperindividualista” da sociedade.
“O campo de centro-esquerda parece ganhar na maioria das discussões técnicas, se afirmando em estratégias ambientais ou sociais, além de esboçar uma concepção de desenvolvimento que parece superar os discursos raivosos ou doutrinários da direita e extrema-direita, mas não dialoga ou convence a base social. É como se fossem dois mundos apartados: o do debate da agenda nacional e o do cotidiano dos brasileiros.”
Rudá Ricci, cientista político
Rejeição a Lula e Bolsonaro
Desgaste da imagem de Lula e Bolsonaro é superior ao desgaste com a política brasileira.
Para Kalil, coordenadora da Pós-Graduação em Antropologia da FESPSP (Escola de Sociologia e Política de São Paulo), outro fenômeno que a pesquisa Quaest aponta é que a aparição de novas lideranças causa um “reencantamento” da população com a política.
Os números da Quaest mostram que:
- 66 % acham que Lula não deve concorrer em 2026;
- 65 % rejeitam uma nova candidatura de Bolsonaro;
- Em um eventual segundo turno hoje, Lula e Bolsonaro empatariam com 41 %;
- 43 % avaliam o governo Lula negativamente; somente 26 % o consideram de forma positiva.
Os dados sugerem que, embora a rejeição a Bolsonaro siga alta (55 %), o petista não capitaliza o desgaste do rival.
Para Ricci, a explicação está no divórcio entre a agenda progressista e as urgências populares, e esse espaço estaria sendo ocupado pela extrema-direita, que usa o “clima carregado” com frustrações do dia a dia a seu favor.
Apesar da rejeição, Lula e Bolsonaro ainda são fundamentais para o crescimento de outras lideranças políticas.
“Mesmo com a rejeição, eles ainda têm muita influência positiva; o caso Bolsonaro é mais nítido, porque ele está inelegível e enfrentando o julgamento do golpe”, explica Isabela Kalil. “Por isso, os candidatos que poderiam herdar os votos do bolsonarismo aparecem muito bem na pesquisa”, completa. “Como Lula é um candidato real e não foram sondados nomes alternativos, é mais difícil dizer.”
Tarcísio ganha com a rejeição de Lula e Bolsonaro, diz especialista.
“Existe um cansaço com a polarização estendida ao cansaço com Lula e Bolsonaro. Quem ganha com isso é Tarcísio, que coloca a sua imagem pública como alguém que está na centro-direita e com condição de transitar entre esses dois campos, mesmo estando mais à direita do que parece”, continua Kalil. “O centrão, por sua vez, aguarda nos bastidores, distante do ‘estrago’ da polarização”, concorda Rudá Ricci.
A Agência de Notícias Cultiva é o setor do Instituto Cultiva responsável pela produção, redação e publicação das reportagens. Sugestões de pauta, erros e críticas podem ser enviados pelo WhatsApp (31) 99577-6556.