Guerra nos bastidores, definição da presidência no Senado e na Câmara, autoextermínio de bolsonarista, revelação de plano por senador bolsonarista seguido por recuo… A semana que marca a volta dos trabalhos legislativos foi pra lá de intensa: e o que fica disso tudo?
Pontos importantes, como uma amostra da força de Lula, da oposição e como será o jogo político nos próximos meses.
Mas os estranhos movimentos do senador bolsonarista Marcos do Val (Podemos-ES) tomaram os noticiários. De uma revelação bombástica de plano golpista com a participação direta do ex-presidente Bolsonaro a tentativa de incriminar o ministro do STF Alexandre de Moraes.
“Após falas contraditórias, ficou claro que Marcos do Val não tinha uma estratégia, mas sim desespero. Ficou com medo que Daniel Silveira, preso, abrisse a boca sobre essa suposta reunião de negociação para o dia 8 de janeiro”, analisa o cientista político Rudá Ricci, em live realizada hoje (assista à íntegra no link na bio da Cultiva).
“Quando ele disse que entregaria o cargo, aparentemente teve um leilão e os bolsonaristas conseguiram dar alguma vantagem – ou uma reprimenda. E o senador, então, começou a se contradizer, estrategicamente, para esvaziar a denúncia inicial”, diz o presidente da Cultiva.
Marcos do Val chegou a falar que o ministro Alexandre de Moraes foi avisado e, assim, poderia ser autor do crime de prevaricação. Mas a fala inicial, da tal reunião, vai ao encontro de outros depoimentos, como o de Anderson Torres.
E o Lula?
Esse episódio envolvendo bolsonaristas abafou, mas um duro embate teve o desfecho ontem: definição das presidências do Senado e da Câmara. Lula saiu mais forte com as duas eleições?
“Do ponto de vista simbólico, sim. Talvez foi a terceira ou quarta derrota consecutiva do bloco bolsonarista. Porém, vai ser fácil para o Lula? Com certeza não, por vários motivos”, analisa Rudá Ricci.
Você já sabe: no Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) acumulou 49 votos ante 32 preferências conquistadas por Rogério Marinho (PL-RN). O primeiro apoiado por Lula, o segundo, por Bolsonaro.
“Com 32 votos, você consegue abrir um pedido de CPI, por exemplo, e pressionar o governo. Temos um bloco governista e um bloco bolsonarista, porém, existe o pessoal que fica no meio. Por mais que tenham votado no Pacheco, eles não são lulistas e nem petistas”, diz o cientista político.
“E são justamente esses senadores que vão jogar o tempo inteiro com a ameaça de dar voto para o bloco bolsonarista, e, com isso, negociar cargos e dinheiro. É isso que o Lula vai enfrentar”, complementa Ricci.
E na Câmara?
Como esperado, Arthur Lira (Progressistas-AL) venceu com folga. Não apenas folga, recorde histórico: 464 votos, portanto, superando o antigo feito de João Paulo Cunha (PT), que acumulou, em 2003, 434 preferências.
“Arthur Lira tinha estratégia, que foi fortalecida nas eleições. Sua origem vem do bloco de Eduardo Cunha, o mesmo bloco que dialogava e fazia acordos com o baixo clero do Congresso Nacional, como chamamos”, diz Rudá.
Baixo clero é uma expressão usada para se referir aos deputados de “pouco poder” dentro da Câmara. Esse conceito existe desde o regime militar. Durante o regime, as conversas e negociações eram realizadas apenas com líderes dos partidos existentes.
Esse grupo de líderes foi denominado de “conselho de cardeais”, portanto, em contradição, “baixo clero” se referia aos de pouco contato com o governo militar.
“O baixo clero geralmente não se preocupa com propostas para o país. Eles se interessam por privilegiar a sua própria base, pensam em como ganhar votos. Pelas mãos de Arthur e Eduardo Cunha, alguns empresários financiaram campanhas desses deputados”, contextualiza o cientista político.
“Portanto, Arthur tem um peso enorme no interior dos estados”, complementa.
Qual é a próxima guerra?
Na disputa de poder dentro do Congresso, as mesas diretoras e as comissões se tornam, agora, o alvo principal. Justamente por concentrar enorme apoio, Lira vai criar cinco novas comissões, entre as quais Comunicação, Ciência e Tecnologia e Saúde.
Com a derrota do candidato bolsonarista no Senado, a tendência é que ocorra uma espécie de depuração.
“Parte de legisladores que estavam com Bolsonaro na gestão passada migrou para o bloco governista. Portanto, o bloco bolsonarista se torna ainda mais radical: quem ficou não tem mais quem pondere”, projeta Rudá Ricci.
E o Lula? “Vai negociar. Perder algumas, ganhar outras, mas sempre negociando”.