“É muito cruel o que pensam sobre a educação”. A frase sintetiza uma das principais preocupações dos profissionais da educação mineira sobre a condução da área no estado. Mercantilização, privatização e o desmonte da educação pública em Minas Gerais foi o tema de um dos debates, hoje (30), no 12º Congresso do Sind-UTE.
Cerca de 2,5 mil trabalhadoras e trabalhadores da educação participam do maior congresso do sindicalismo mineiro, realizado durante quatro dias seguidos até quarta-feira (1º), em Contagem.
“A Secretaria de Estado de Educação de Minas tem o seguinte pensamento: transferir a gestão das escolas para as OSC (Organizações da Sociedade Civil), que são organizações não-governamentais que possuem uma visão empresarial da gestão escolar”, afirma o doutor em Ciências Sociais e presidente da Cultiva, Rudá Ricci, autor da frase que abre esta publicação.
A lógica mercadológica é exemplificada na tentativa de criação do voucher, iniciativa importada dos EUA. Resumidamente, o Estado transforma o dinheiro investido nas escolas públicas em uma espécie de cheque, que é dado aos pais para custear os estudos da criança em uma rede privada.
“O problema é que 60% dos impostos no Brasil vêm de quem ganha até dois salários mínimos, rico não paga imposto. O dinheiro que está nas escolas públicas são dessas pessoas que ganham até dois salários. Ou seja, o governo quer transformar esse dinheiro em cheques para que os pais paguem uma escola particular para o filho: isso é você pegar um dinheiro que é do pobre para dar para o rico”, afirma Rudá Ricci.
Mercantilização
Outro ponto debatido, ainda sobre o processo de privatização da educação, foi o projeto Somar. É uma iniciativa embrionária do governo estadual justamente para passar às OSC a gestão de escolas estaduais. Levantamento realizado pela Cultiva mostra que, onde foi implantado, o projeto apresentou falhas graves.
“Entrevistamos vários professores sobre esse projeto e apresentamos algumas falas que mostram como é o descaso e a falta de cuidado com esses profissionais”, afirma Rudá Ricci.
“Teve adoecimento entre os nossos colegas, muitas angústias… e foi um ano difícil, um ano difícil porque você quer continuar o seu trabalho e dar conta dessas questões”, desabafou uma das entrevistadas em 2022, ao falar sobre o processo do projeto que transferiu a gestão de três escolas estaduais à iniciativa privada.
Uma denúncia, encaminhada ao Ministério Público do Trabalho, expôs uma série de atividades que demonstram a desorganização administrativa da OSC nas escolas:
- atrasos em assinaturas da carteira de trabalho dos profissionais contratados
- ausência de pagamento dos salários e vale-transporte
- contratação de profissionais sem devida capacitação prévia, entre outros pontos
‘Desmonte’
Além de Ricci, outros dois estudiosos participaram da mesa que discutiu os rumos da educação mineira: Analise de Jesus Silva e Heli Sabino.
Mestre e doutora em Educação, Analise mostrou como a gestão atual tem enfraquecido o Fórum Mineiro Educação, do qual é integrante. O objetivo, afirma, é tirar todas as entidades da sociedade civil que fazem parte e são críticas ao modelo que está sendo implantado.
“Não dá para ir para a sala de aula se trabalhar um conteúdo especifico, sem trabalhar politicamente esse conteúdo”, citou a professora, que ainda exibiu pareceres do fórum que mostram o não cumprimento, pelo Governo Zema, de nenhuma meta do Plano Estadual da Educação.
Analise, inclusive, recebeu o título de Sócia Honorária do Sind-UTE/MG, durante a mesa. O currículo de Analise é extenso: entre títulos e atividades, mestre e doutora em Educação pela UFMG; tem pós-doutorado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); pós-doutorado na Universidade do Minho (UMinho) Portugal; trabalhou com Educação Básica em redes públicas e particular por 29 anos e foi diretora de escola eleita e presidenta eleita do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte.
12º Congresso do Sind-UTE
O maior congresso do sindicalismo mineiro é realizado de domingo (29) a quarta-feira (1º), no Actuall Hotel, em Contagem, e reúne milhares de trabalhadoras e trabalhadores da educação mineira. Confira a programação completa AQUI.